terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Carta de Renato Tapado a Clarice Lispector

Minha angústia é que jamais vou te conhecer. Eu que, como todos, fracassei. Mas o que eu tinha para te oferecer não era esse fracasso. Era a urgência na espera, o domingo vazio que não sei ocupar. Minha companhia são os livros e os discos. Mas, se já li tudo o que é seu! E agora, que você poderia ler o que te dou de presente como uma pétala, você não está. Mesmo assim, te escrevo uma carta, que é aventura numa garrafa ao mar. Te escrevo porque minha sensatez me impede de conversar com os vivos. E choro quando penso que nasci tarde, e a hora agora é a do desprezo, da guerra e da mediocridade. Vivo para mim um minuto do outro. Como Saint-Exupéry, me perco nas areias do grande deserto – mas vôo. Este caderno é um exercício de sobrevivência. O que te dou – me perdoa – é essa dor sem remédio, mas com ela podemos nos aquecer, nós dois, em volta de uma busca com bom vinho. Se estivesses sozinha, minha vontade era beijar teus lábios grossos de esfinge. Você tem um desejo sinuoso, mas forte, que chega a assustar, e eu queria encontrá-lo. Há tempos sem te ver, já possuo o cerne do desassossego. Quando penso que você está caminhando em Copacabana esmaltada de pedras pretas e brancas e chuvas, em meio ao ruído faiscante dos pneus na água, e eu aqui, soletrando a imprecisão do instante no chuvisco frio de outono, minha vontade é de beber um conhaque – eu, você e Drummond. E dane-se a etiqueta. (Você vai rir, mas um de meus insistentes desejos é estar em sua casa, e você descalça no assoalho. Nada me convence que seus pés são pequenos, delicados, você, ucraniana, disfarçada de carioca que já viveu o mundo. Esses pés, por ora, só ao vê-los estarei contente, tal a sua disponibilidade, não em desfilar, mas descansar sorrateira e levianamente sobre o braço do sofá. Meu segredo mais remitente é que, um dia – lá pelos tantos tempos que teríamos a sós, dentro de uma nuvem de palavras e olhares –, eu pudesse massagear seus pés, quase com vergonha, com um tremor nas mãos, você fechando os olhos.) Então, quando tua empregada trouxer o café e deixá-lo sobre a mesa, você fingirá que esse meu olhar para a empregada fugidia não significa nada, apenas o café está aqui, vamos bebê-lo. Você é uma espécie de Virginia Woolf ensangüentada pela luta com uma galinha viva. Sei da voracidade latente em suas mãos, mesmo longe da máquina de escrever, mas quero contê-las como ovos, pássaros, conchas. Ter em minhas mãos a quentura inacessível de tua palavra escondida na garganta.

Hoje, vi um trinta-réis pescando. Sou hipnotizado por um pássaro comendo, tudo concentrado ali no instante inapreensível nesta frase. Não sei o que procuro, na verdade estaco diante da iminência do susto, sabendo-a, como a gota escorre, lenta, sobre a pele. Então, me atinge a fome. E tudo isso me atormenta como se eu estivesse contente, mas não, é a perdição do oco de um domingo vadio, exposto a essa brancura que é minha vida sem um risco, gente indo e vindo, e suas vozes me irritam. Mas ainda me distraio, passeio, olho a nuvem amarela do poente, mordo o pêssego, salivo o vinho branco e me acaricio. E é só. Depois, o dia desaba sem ninguém, precário, empurrando tudo. Me crispo na urgência da página, vem o teu nome, o dia se dobra sobre si mesmo, entrópico, como o caule de um segundo me sugando, a noite, uma espessura só, um jazz que me levita, e o teu perfume que imagino, mas você segue vaporosa. Esta carta é uma mão apertada, como um beijo no escuro.

Clarice, nada, nem o mar nem Chopin na manhã escura de um sábado de inverno, nem um jazz ao vivo ou o beijo de alguém que me arrebata, nada me assegura o mesmo espanto trêmulo que seria te encontrar na tessitura de um dia sem pressa. O fato de essa possibilidade estar extinta me esbofeteia como o vento escancarando as janelas em meio à tempestade. Não há coisa mais estranhamente triste que algo inexorável. A pulsão de escrever vem abafar esse escândalo que me entontece o corpo, a ausência tua que não pára de crescer e se arvorar no inferno. Tempo é a merda do mundo. Ele mói o o encontro possível. Meu consolo é nulo. Mas como não tenho para quem escrever, escrevo para você. Dentro dessa esfera afásica, só sou porque insisto. E escrevo porque, se estas cartas pararem nas mãos de alguém, e esse alguém acordar para a verdade jogada na cara, veludo e farpa, como te ofereço a face ao teu gesto sem luvas, e esse alguém gritar no meio da noite porque a palavra desloca as paredes e demole muros, então estarei salvo, próximo, não de tocar você, mas sentir o perfume de um corpo com sede, diante do mar inalcançável. Então, eu brindarei contigo.



Nada mais sincero para encerrar as postagens deste ano, Renato me deixando literalmente sem nada a dizer...



sábado, 26 de dezembro de 2009

vai carlos, ser bobo na vida

nessa cidade
qualquer um se diz dono da própria identidade
quem sabe, é o que cabe pra quem acha que sabe
quem tenta, ganha só pelo nada que sabe
e ainda dá de dez às dez num cara que vive só pela metade
nem reza cura nem prece sara
livra essa cara
desmascara esse outro cara que nem tem mais cara de viver só da verdade

um anjo chegou e lhe disse: torto...

corações que não mais batem como tambores

Nem só de solidão vivem os mortos;
Todos os jardins precisam ser regados

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

mudando

como pinturas claras e simples, o sol é aquilo que se vê

domingo, 8 de novembro de 2009

ser marginal, já que ser herói...

se eu decidir fechar os olhos, morro
se tu escolher a mesma porta, desisto
se ele não quiser me escutar, grito

se nós não fôssemos tão caducos, mudaríamos de nome três vezes por dia
se vós não tivésseis esses olhos tão cansados, viveríamos todas as estações num dia só
se eles não nos seguissem, seríamos viajantes e não passageiros

quanto a mim, tão bemol assim sem vocês

queria ser outro, não esse que sou agora
talvez fosse mais, penso que sim
e já que não sou, não escolho
tento ser e não ter
mas enquanto não vem o fim,
não espere nada de mim

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Se têm a verdade, guardem-na!

"(...)Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!(...)"


Lisbon Revisited


Fernando Pessoa brincando de ser Álvaro de Campos

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

me sorri um sorriso natural

A voz de meu avô arfa. Estava com um livro debaixo dos olhos. Vô! o livro está de cabeça pra baixo. Estou deslendo.



Manoel de Barros

sábado, 17 de outubro de 2009

Há uma gota de álcool em cada poema

Conta o tempo que o mundo desuniu
Mas conta certo, pois faz tempo que não é 1º de abril

É, e olha bem, quantas profecias já não ouviste sobre o fim do mundo? E continua embebedando esse seu pessimismo e dizendo que agora é. Agora é o fim do mundo.

Pois você sabe desse seu coração, que é de vagabundo e que não duvida, pode até ter dúvida, não digo que não, mas é crente que só vendo!
É crente feito criança que olha pro algodão doce da praça e olha pro céu e pergunta pro moço do doce de que sabor é o branquinho lá do alto. Ai que graça!

E segue assim, vagabundo de raça e poeta, não duvida até o último dia de sua vida.
Ou até a última gota de cachaça. Ai que desgraça!



"Bebe enquanto puderes; quando tu e os teus
Já tiverdes partido, uma outra gente
Possa te redimir da terra que abraçar-te,
E festeje com o morto e a própria rima tente."
Lord Byron

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Um dia depois de sexta

Hoje vi um edifício chamado saudade. O trânsito estava caótico, quase bati o carro. E o céu, li esses dias em algum lugar uma definição que cabe aqui agora; li que São Paulo tem às vezes esse céu, prateado, que vai cobrindo a paulista em tons de cinza cintilante e que quase ninguém percebe. E acho que era assim que estava o dia hoje, prateado, bonito isso. Foi num dia assim em 87 que vi Luiz acenar pra mim de dentro do ônibus na rodoviária. A última vez que vi Luiz e ele estava tão contente. Só não havia esse trânsito de hoje, e um edifício chamado saudade era apenas um edifício chamado saudade.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

tocaraul

Pedro onde cê vai eu também vou

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Solo quiero saber lo que puede dar cierto
No tengo tiempo a perder



Titãs

domingo, 4 de outubro de 2009

Era infinitamente maio e Jó Joaquim pegou o amor.



GuimaRosa

terça-feira, 29 de setembro de 2009

I try so hard to stop wasting my life

ópios édens analgésicos
não me toquem nessa dor
ela é tudo que me sobra
sofrer, vai ser minha última obra



Paulo Leminski

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Semitom Semi estou

Acordei Bemol
acordei bemol
tudo estava sustenido
sol fazia
só não fazia sentido


Paulo Leminski

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

sem saudade sem remorso só

a neve é branca o suficiente
e a noite escura é suficiente
faz tudo parecer tão inocente
mas, tão triste sem gente

não que neve e noite não sejam auto suficientes
mas é que às vezes faltam os olhos
tão carentes!

liguei a tv e deitei no sofá

quando eu olhei pra cima e não te vi
não sabia o que fazer
fui contar pr'aquele estranho que eu gostava de você
ai ai
será que foi assim?
que foi o tempo que tirou você de mim?

e ele num momento hesitou
mas depois não resistiu
me contou que mil balões voando foi o que ele viu
pensei: não é possível que eu não tenha reparado
eu devo estar girando o mundo para o lado errado

Tiê - Quinto Andar

bonjour madame, o que você vai querer?

pede a conta e conta o tempo
tudo que parte faz parte disso que se parte
quem fica é a dica dessa vida aflita
que eu sem você não tem razão e é sem noção, eu sei
que quando você está tudo está também, você sabe
se não, quem sabe não é
a minha bagagem a cair do avião
ou não.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Odeon

Não há nada mais triste que um choro
Não, Não! Não há nada mais alegre que um choro
Ah, o choro…
Desceu dos Engenhos, banhou a costa e não se calou mais.
Primeira, Segunda, Terceira, e quantas outras gerações desses chorões!

Que melodia; é a menina dos olhos, é a Garota de Ipanema antes de Vinicius
A Mulher É Um Diabo de Saias e o choro é a visão de raio-X
Cuidado, não se assustem, até o diabo tem lá suas sutilezas
Saibam ouvir, mas tenham cautela, sim sim, é certo que sim.

E vejam, sintam:
Ingênuo, Carinhoso, Urubu Malandro, ah mas Naquele Tempo era
André de Sapato Novo e eu Vou Vivendo, Lamento, Apanhei-te Cavaquinho!

Ah que saudade, e isso é coisa de brasileiro
Mas eu não quero essa saudade das rosas
Não quero essa tristeza perfumada
Quero o choro! Por favor, um copo transbordando de chorinhos
Pra que eu possa morrer chorando
E viver amando…

Quando eu me for, diga que deixei um abraço à Pixinguinha e todos os outros
Diga que foi por causa deles e desse choro que ficou por dizer
Que eu fui
Pra não sofrer
Pra não me morrer de amores, só Vinicius morre de amores
E é feliz

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Ad Infinitum

"Com as lágrimas do tempo e a cal do meu dia eu fiz o cimento da minha poesia."
-- Vinícius de Moraes


Então sou assim, e sofro
Sem como, nem quando, onde ou porquê...
Antes não tivesse nascido
Antes não fosse, queria mesmo era não ser! Ah, idéias....

E é essa convivência amargurada
da parte naufragada com a fingida
Que me mata e não me fortalece
Tentei até ser atriz
Mas teve um instante em que não sabia se era ainda fingimento

Pessoa me entenderia!

E tu ecoa, forte e nobre

Não sei se sempre fui ou se sou agora
Assim
É uma linha tênue, finíssima, sem comparações, é só e impera
Ainda que nem sempre se alcançe,
Tu és a fidelidade e bem sabes que me fez refém

Mas me confundo, me contradigo

"É ela! É ela!" Rimbaud já sabia..
É tu! E só tu... bem sei!
E digo:
Amiga minha, não devias me fazer morrer assim
Na tua ausência, nada sou, ninguém é!
Só que a maioria não faz juízo dessa insanidade
Ah minha amiga... se soubesses!
É só quando te sinto por perto que sinto o que sinto
Deve ser o que chamam de amor, gritado sempre aos quatro ventos

Vivo assim, agora sabes qual é minha condição
Me rendo, sou tua e só em ti a verdade é sincera
E a imensidão existe
Singela, contigo minha afeição cresce e explode
Por não caber aqui e agora

Do conflito à calmaria
Verso (Re)verso (Contro)verso
Ver, só

Só tu és tempestuosamente tranquila

Tudo que faço nessa vida é esperar
São esses instantes raríssimos
Pelos quais guardo o ar
Para não deixar faltar - por esqueçer de respirar -
Quando me vejo e vejo a ti, em mim
Pura e aqui
Sussurro agora para que nenhuma outra voz venha dizer o que lhe digo
É segredo nosso esse
Que te entrego agora, porque tu sabes...
A ti confiei a minha vida, sem saber

E é por ti que permaneço

Vou aprendendo, me curando do mundo, e me ferindo mais e mais
Não tem fim

Só por ti ainda existo ainda sou e sei
De ti, sei o que não ouso sentir jamais por outro alguém
Não ouso nada a não ser amá-la
Te procuro em cada canto e sempre
E incessante sigo teus rastros
Por mais ínfimo que seja
Grão de sorriso, milionésima parte de uma lágrima
Cega e louca e amante e tua

sábado, 8 de agosto de 2009

poeta bom, meu bem, poeta morto

Em algum lugar onde nunca estive, e felizmente aquém
De qualquer experiência, teus olhos guardam seu silêncio:
Em teu gesto mais frágil há coisas que me envolvem
Ou que não posso tocar porque estão muito próximas

Teu olhar mais leve facilmente me descerra
Embora eu me tenha fechado como dedos,
E me entreabres sempre, pétala por pétala, como a Primavera
(Por toques habilidosos, misteriosamente) abre a primeira rosa

Ou se teu desejo é me fechar, eu e
Minha vida nos fecharemos formosa e rapidamente
Como quando o coração desta flor imagina
Que a neve - cuidadosamente - está caindo em toda a parte;

Nada do que podemos perceber neste mundo se compara
Ao poder de tua intensa fragilidade; cuja textura
Me compromete com a cor de seus países
E me entrega para a morte cada vez que respiro

(Nada sei do que te faz tão poderosa
Ao me mover; mas algo em mim compreende apenas
Que a voz de teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
Ninguém, nem mesmo a chuva, tem as mãos tão pequenas.


e.e. cummings

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Nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
De qualquer experiência teus olhos tem o seu silêncio
Do teu gesto mais frágil há coisas que me encerram
Ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

O teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
Embora eu tenha me fechado como dedos, Nalgum lugar
Me abre sempre - pétala por pétala - como a Primavera
(Abre) tocando sutilmente, misteriosamente a sua primeira rosa (sua primeira rosa)

Ou, se quiseres me ver fechado, eu e
Minha vida nos fecharemos (belamente, de repente)
Assim como o coração desta flor imagina
A neve cuidadosamente descendo em toda parte

Nada que eu possa perceber nesse universo iguala
O poder de tua intensa fragilidade, cuja textura
Compele-me com a cor de seus continentes
Restituindo a morte, sempre, cada vez que respira

Não sei dizer o que há em ti
(Que fecha e abre) só uma parte de mim compreende
Que a voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas
Ninguém - nem mesmo a chuva - tem mãos tão pequenas


zeca baleiro

segunda-feira, 27 de julho de 2009

E eu queria ser inglês, e ter um guarda-chuva

Nove milhões de dias chuvosos
inundarão a cidade,
afogarão invejosos.
tchutchururutchu

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Once upon a time in Neverland...

Acrobata da Dor

Cantando, encanta, no canto que o atormenta,
como um super astro, que iluminando vai com seu Moonwalk,
dança, ri, gargalhadas thrilhando sucesso
não lhe deram nem Carta de Alforria e sua genialidade na capa da revista é agora violenta.

Da gargalhada tímida, Jackson five,
agita os tablóides, é a inspiração
salta, voa, salta clown, amado
vai se escondendo numa agonia lenta ...

Pedem-se bis e um bis não há de recusar jamais!
Vamos! This is it. O mundo o aguarda,
com essas suas engenhosas piruetas d'aço...

E embora caias sobre o chão, majestosamente,
afogado em teu sucesso, grandioso é o picadeiro
Canta! Coração, tristíssimo caricato.


Uns rabiscos em homenagem ao pequeno Michael e que traduzem um pouco do que eu estou pensando agora... Eu escrevi e reescrevi esse post, deletei, apaguei, arrumei, mas está difícil definir ou expressar qualquer coisa... realmente, tenho vivido dias muito estranhos.



p.s. Acrobata da Dor poema original pertence ao poeta simbolista do séc. XIX Cruz e Souza.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Eu me contenho diante do mar. Seus olhos eram dois.

Coisas de que gostava, me irritam; jogo e bebida me cansam, acho que ando só. E bem. Curto isto por dentro, me tranco. E me pesa numa pancada só, numa porrada só.


João Antônio

domingo, 31 de maio de 2009

Mesmo que o mundo se acabe em mim

E quando eu estiver morto
Suplico que não me mate
Dentro de ti





Nando Reis Sutil Mente

in verso

Antes fossem noites essas tardes mortas que asfixiam
Antes fosse a vida!
Mas não, essas horas tão longas e que lentas vão longe
Que não findam e sim ficam e assim viram (slow motion)
Se fundem, alimentando ainda mais a fúria

Sem notar entro nessa arritmia

Dessas horas claras, dessas tardes fúnebres
Meu coração pulsa preguiçoso mas tão forte que
Decerto há de ter ali um outro órgão, instrumento que dança
Conforme a música
Há de ser então, um tambor (silencioso)
Ah, só eu sei

Dessas tardes
As de domingo então...
Só Deus sabe

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Vero

Deu por sí, conclui, sem ao certo saber porquê
Aquele homem, não, não era mais
Mais que um verme, de tamanha podridão
E, visto que não havia de salvar-se, pôs-se de joelhos; tudo em vão

Larvas lhe cobriam a visão, podre imundiçe interior, restou
Seus gritos não mais eram sentidos, em meio àquela multidão, sussurro
Enfurecia, mas, putrefada, sua carne não mais sentia
Cego, e os berros, e a ausência da dor, sussuros tão altos que agora, a multidão ria

Pois ali, meu Deus, era um homem
Antes, e prevendo o que havia de ser, almaldiçoaram-no
Deixa, esse verme as larvas comem

E ali, meu Deus, exalava à inseto
Pisoteado, vencido por um desejo, este que a todos consome
Deu por sí, num último suspiro antes do mergulho da loucura eterna
E era só seu próprio manifesto

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Tua tatuagem sou eu

Tô numa fria. Dançando num campo minado, cega com a luz do sol das dez. Torcendo pra não pisar em falso e, dispersa num mundo irreal. Se pisar, também... - penso eu - Diferença faz?
Olhos voltados pra qualquer lugar, cega, com o sol prestes a explodir, apenas sinto. Campos mofados, morangos velhos, gosto amargo, remorso e todas essas bombas

Explodir, vou dizendo...
E vale a pena? Eu quis crer que sim, fui fiel demais a princípios infundados, agora me parecem menos certos do que antes, mas eu não vou parar. Calafrios andam junto a mim, o medo me consome, mais forte do que antes. E eu não sei parar. Não aprendi a olhar pra trás e talvez nem queira. Agora tudo parece tão pequeno, assustadoramente menor do que antes. Tudo é tão passível de conformação. Sou toda conformista, por fora, e por dentro, mais do que antes.
Antes - ontem, um segundo atrás, 10 anos atrás. Agora sim. Estou perdendo o controle e me perdi nessa dança e vou ficando pra trás. Ou aqui mesmo, mas mais comigo e menos com os outros. As bombas, parece que começou e eu não sei se me importo com as consequências. Elas vem, ficam e passam (talvez não passem). As pessoas me vêem mas não como eu sou. As pessoas não me importam mais. Agora bem mais do que antes, deixaram de ser. Assusta. Queria não ser assim, mas simples e calma apenas sou. Apenas aceito. Apenas acredito.

Cética. Individualista. Esquerdista. Às vezes ecologista, outras, capitalista. Quem sabe aonde isso acaba? Vazia. Nada por dentro, nada material, apenas espírito transbordando e eu não sei de onde vem toda essa força. Não nasci assim, me tornei assim. Não sei se sou fruto do meio em que vivo. Ou se o meio em que vivo é fruto do meu ser. Talvez seja. Aceito.

Acredito.
Pode alguém viver só e ser feliz? "Saibamos pois, estamos sós..." só isso em si já é uma afirmação de que, apensar de sós, estamos juntos. Na mesma barca que pode ou não nos levar a algum lugar.

Pode nos levar
Pode me levar

A mim
e só

sábado, 28 de março de 2009

as Flores de plástico não morrem

olhei até ficar cansado
de ver os meus olhos no espelho
chorei por ter despedaçado
as flores que estão no canteiro


sábado, 14 de março de 2009

Ato de tornar-se.

Um sol que nasce unicamente em cada janela
Uma vida solitária acaba em uma janela
Um dia florido seguido de uma semana vazia
Uma briga de rua
Um casal que se desfaz no outono
Um cara que sente falta de seu amor no inverno
Uma pequena atitude que partiu uma vida
Um grande engano que partiu corações
Um sino tocado no fim de tarde
Um relógio quebrado na gaveta empoeirada
Uma vida empoeirada
Um sol quebrado no outono
Uma taça de vinho quebrada e uma noite sem fim
Um homem solitário seguindo seu grande amor
Um inverno que parte corações
Um sino jogado de uma janela
Uma rua que guarda fins de tarde unicamente vazios
Um quê de solidão em cada palavra de um velho diário
Um universo todo de solidão em cada palavra
que marca meu coração empoeirado
nessas tardes vazias frias
desde que meu pequeno amor de grandes olhos ensolarados
quebrou minha rotina escancarou minhas janelas
renasceu em mim como um dia florido de amor infinito
que finito ficou no instante em que se quebrou
a taça e o vinho que continham em segredo o nosso amor

sábado, 7 de março de 2009

Desesperança

Sem saudade. Não ter contentamento.
Ser simples como o grão de poesia.
E íntimo como a melancolia.

Apavorado acordo, em treva. O luar
É como o espectro do meu sonho em mim
E sem destino, e louco, sou o mar
Patético, sonâmbulo e sem fim.

Sou o mar! sou o mar! meu corpo informe
Sem dimensão e sem razão me leva
Para o silêncio onde o Silêncio dorme

Enorme. E como o mar dentro da treva
Num constante arremesso largo e aflito
Eu me espedaço em vão contra o infinito.


Fragmentos de Quatro Sonetos de Meditação, Vinícius de Moraes

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Lonely Hearts


Club Band

Adoro Carnaval

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Morrer não dói

No começo foi estranho, passar os dias tentando desaparecer, mudo e telepático. As horas passavam e o que eu sentia era tudo, mas de tão tudo era um nada imenso que me fazia pensar como era possível caber tanta coisa dentro de um só ser. Eu acho que era como se a minha alma tivesse caído num buraco negro dentro do meu infinito universo. Eu não chorei nem fiz escândalos ou juras de vingaça sabe-se lá a quem ou o quê. Apenas ia como passam as chuvas e os ventos. Tentando não ser. Pra mim era muito difícil seguir a vida no escuro, e sim, a não-claridade das coisas me assustava. Mas, eu tinha mais medo do que iria encontrar se acendesse as luzes.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009


eu estou deitado no seu jardim
e me pergunto
será que você demora a chegar?
não sei se aguento esperar
o céu está tão azul que está me deixando cego
é muita luz pra quem viveu tantos dias como se fossem noites
(à sua espera)
antes que eu me esqueça, you are all I need
quando eu disse que estava no meio de sua fotografia
você sabe o que eu quis dizer, não sabe?
sempre foi seu grande prazer
eu só queria fazer parte disso
e quando eu disse que mentia nas entrelinhas
você sabe, eu sempre fui frágil demais para as suas aventuras
eu queria que você pensasse que
em algum lugar em mim existe uma fortaleza
eu queria que você acreditasse que eu sou especial
que você descobrisse que eu escondo algum grande
segredo
é assim que eu me sinto
não sei se porque eu quero
ou se porque é mais uma das minhas verdades
que você preferiu ignorar
eu quis
causar em ti a mesma sensação de uma foto quando revelada
ah, e antes que você começe a chorar (se chorar) saiba que
eu te perdôo
por todas as minhas noites de insônia
por todas as minhas cicatrizes
pelo psicólogo que eu frequentei durante anos
(como se a culpa fosse toda minha)
pelo meu vaso francês que você fez o favor de quebrar
pela minha quase-overdose-fatal
pelos piores meses da minha vida
(aqueles, longe de você)
te perdôo até pelo seu café horrível
e por você fumar compulsivamente
te perdôo por você ter levado ao nosso bar
(aquele onde nos conheçemos - ou já se esqueçeu disso também?)
seus tantos novos amantes
aqueles; facilmente conquistados
com vinhos baratos
te perdôo pela humilhação
de ter meus pertences jogados janela a baixo
e por conseguir me fazer destruir a chance da minha vida
só para ficar ao seu lado; não que eu me arrependa
só queria chamar a sua atenção agora.

sem o vaso que era herança de família
sem minha quase-nova-vida em New York
naquela editora; você ainda se lembra daquele dia?
sem minha droga favorita que você amargava
(ou adoçava) demais
mesmo virando um fumante passivo
com seqüelas de overdoses de remédios
e cicatrizes nos braços e rosto por ter me jogado do seu carro
(insano)
eu não sei como
queria ter uma explicação
foi só isso
só isso, e nada mais o que eu busquei
insistentemente sem nunca encontrar
nas aulas de filosofia
nos livros de literatura medieval
nos poemas de Maiakóvski
nas histórias de amores proibidos
de todos os séculos
de todas as culturas
de todos os planetas
se necessário fosse
eu iria à Plutão
se eu soubesse que lá estaria
a peça-chave do nosso encantamento
uma resposta para tudo que eu sinto por você
tudo de bom e incrivelmente lindo e
estou perdendo a respiração
só de pensar em você
eu sinto e sentirei
por toda a minha vida
apesar de tudo...
(eu não sou ingrato, nunca fui)
você sabe que a sensatez sempre foi meu forte
(até eu me perder em você)
eu não sei como nem quando
eu não sei de muita coisa na verdade
mas tem algo bem importante que eu sei
e talvez essa seja a única verdade que nós precisamos conhecer
voé tudo o que eu preciso
tudo é pouco e pequeno
perto de nós dois
juntos, como éramos
e tantos outros desses sentimentos
que as pessoas quando estão apaixonadas
gostam de gritar pra quem quiser ouvir
mas eu não
não quero que todos ouçam
a única pessoa que realmente importa é você
eu sei que eu só fui o filtro do seu cigarro
e que depois de me usar você me esquecia
em algum cinzeiro de prata num canto qualquer
mas sem mim você jamais conseguiria sobreviver
e esse é um fato irrevogável
outra verdade incontestável a nosso respeito
eu espero que você me perdoe também
na verdade, só estou fazendo isso
porque acredito que você já tenha me perdoado
mesmo antes de saber o que eu ia fazer
ou o que estou prestes a fazer
você sempre foi compreensivo
eu devo ter perdido algo de vista
eu devo ter errado em algum ponto
mas agora eu estou além de todos os pontos
peço desculpas pela minha falta de atenção
eu estou a um passo de cometer uma grande idiotice
ou um grande ato de coragem e amor-próprio
vou deixar o último porquê da minha vida
por sua conta!
eu gostaria que você publicasse isso algum dia
e no final escrevesse que:
Ao som de alguma música triste e harmoniosa
ele morreu.
Era uma tarde linda e o sol ardia forte no céu
contrastando com nuvens brancas e enormes
Ele iria preferir se estivesse chovendo, como sempre
Mas tinha algo novo no ar
que compensou aqueles pequenos defeitos
e coisas fora do lugar
Ele estava em paz e feliz
Durante sua vida
Conheçeu, apaixonou-se
E fez apaixonar-se
Entendeu alguns mistérios da alma humana
que sempre foram um ponto
de interrogação para todos os outros

O que de uma forma ou de outra
costurou os atos falhos de sua vida de um jeito único
Foi marcante na vida das poucas pessoas
que tiveram o prazer de conhecê-lo verdadeiramente
Mas um deles foi
Especial demais para ser esquecido
E doce - não demais - porque sua doçura nunca foi um exagero.
E ele o amou até o último dia de sua vida, e morreu envolvido
por seu jardim e suas acáceas amarelas

Se quiser acrescente algo a seu gosto.
Só não diga clichês como
Ele foi um grande homem
Teve muitos amigos
E foi amado por sua família

Até porque isso seria uma grande mentira.


you are all I need

eu estou no meio da sua fotografia
(mentindo nas entrelinhas)

você é tudo que eu preciso
e não existem outros

eu sou um animal tentando sobreviver no século XXI
eu sou uma espécie de miragem dos centros urbanos

eu estou a um passo daqui
(esperando pela próxima vítima)

eu sou todas as pessoas
que você um dia já ignorou

quisera eu ter a sua capacidade de seduzir
eu sou um mero peão no seu xadrez

tem algo estranho ao seu redor
(eu avisei que você devia controlar suas palavras)

espero que você esteja preparado
posso começar?
eu só estou aqui para te dizer que

caso você ainda não saiba
você é tudo de que eu preciso

você é tudo que queima dentro de mim

você está nas minhas melhores piadas

você é a letra da melhor música que eu já compus

você é a minha sinfonia preferida

você é
o meu dia preferido da semana
o melhor pôr-do-sol que eu já presenciei
a chuva que cai quando eu mais preciso

cada gosto, aroma ou voz sutil

o cheiro de hortelã do meu chá podia até ter o seu nome

eu tentei não fazer isso mas
eu estou te confundindo? eu devo estar... peço desculpas

eu sou todos os meses
que você passou longe de mim

temo que não tenha restado pedaço algum

nada de bom
eu sou

eu estou em todas as suas paredes
eu sei eu sinto

cada rachadura é um retrato de uma briga

cada mancha na parede mal pintada da sua sala
é um pedaço de mim
e cada cor respresenta um pouco do que estou sentindo agora

eu só existo quando você está comigo

you are all I need

suas palavras
me causaram dor e incontida felicidade
nostalgia e vontade ardente por novos dias
me causaram e causam ainda
influência; logo eu, tão seguro e devastador
como costumava ser, antes de você surgir
as suas verdades
me trouxeram a este ponto
sem volta sem novos horizontes
apenas aqui.
e como se de repente eu tivesse esquecido tudo o que aprendi
como se até a mais simples palavra precisasse de dicionário
insegurança
desejo em agradar-te
em fazê-lo sentir 1% do que sinto
já seria algo grandioso
como uma foto gigante do sol espalhada em seu jardim

de repente eu simplesmente aceitei que

you are all I need

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Eletric Girl

São dias como esse que saem da minha cabeça
E a única coisa de que eu me lembro é o nome dessa cidade
Você estava lá, e de repente, eu nem sei como
Eu não posso olhar para baixo, tudo isso me faz muito mal
E você me faz ficar aqui
Um furacão passou por nós
Eu estou vazio como nunca estive antes
E só estou aqui por sua causa
Não são os sentimentos que me fazem ficar, mas as lembranças
De dias passados; de quando ainda éramos fiéis ao que sentíamos.

Por mais que eu tente
Ás vezes eu fico imaginando
Porque você é a única que eu ainda quero por perto?
Minha cabeça dói, eu preciso dormir
Mas você ainda é a dona dos meus pensamentos
Você ainda é o fantasma na minha alma
Ainda é a única que eu quero ao meu lado nas noites chuvosas
Eu escuto seu nome
Estou dizendo, é mais forte que eu
Eu não tenho escolhas
Não consigo não acreditar em você

Não vou declarar-me tanto assim à você
Mas certas coisas estão claras em minha mente
Você é a dona dos meus sentidos, de tudo que eu faço e sou

Game Over

This is the end
This is the end
Of our elaborate plans, the end
Of everything that stands, the end
No safety or surprise, the end
I'll never look into your eyes again
Can you picture what will be?


O fim do riso e das leves mentiras
O fim das noites em que desejamos viver
É o fim.

The Doors, parece que vai durar a noite toda!

Doors, The

We had all
That lovers ever had.
We just blew it, And I'm not sad.

Como eu sei? Eu só sei...

Choveu ontem, e antes de ontem também. Hoje ela não veio - e isso muito me entristece. Dylan tem me consumido com suas melodias, estou com sono, com medo e anciosa. As aulas logo começarão e então, só eu sei. Espero que amanhã faça frio. Odeio o calor dessa cidade, estou com saudade dos meus cachecóis (que palavra estranha). Ainda bem que a nostalgia de dias atrás foi embora, essa era outra coisa que estava me consumindo.

"How does it feel, how does it feel? To be on your own, with no direction home Like a complete unknown, Like a rolling stone..."

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

apple

cata-ventos: meu único e solitário amor
tinta escorre pela página, os dias se esvaem
numa calma manhã você me fará uma serenata
mas eu insisto; cata-ventos, cata-ventos, cata-ventos.





Estranha coisa

Inverno, inverno. Acho que jamais desfrutei tanto do inverno. Que quadro maravilhoso! Neve, neve. Brancos montículos quebradiços se mantêm de um lado e de outro da rua. As calçadas serpenteiam como uma passarela amarelo-clara. O céu está cinzento e tristemente tranquilo. As árvores, os prédios e a terra... tudo se encontra sob um manto de neve. Você caminha, fala e, de repente, dá com um grupo de árvores imóveis, com os galhos retesados sob uma colcha de neve.

Vejo a escuridão tingida de azul que flutua ao redor, no ar, vejo aquele véu branco e leve e sinto na alma uma alegria e uma felicidade comovedoras.

Estranha coisa, a vida. Antes, parecia-me ser livre, dar a tudo um sentido, ao passo que agora, mesmo querendo, eu não poderia fazê-lo. Então você entende: isso é amor, e isso é felicidade, e isso é alguma outra coisa ainda, mas a certa altura tudo parece misturar-se num único sentimento que se esconde nas profundezas da alma. E que não quer mostrar-se completamente, limitando-se a assomar quase como uma sombra incerta. Não o sei explicar. Mais de uma vez, tentei sufocá-lo.

Nina Lugovskaia

No Surprises

Feridas que não cicatrizam
No alarms and no surprises
(Silence)

You look so tired and unhappy
Eles não falarão por nós
Eu vou levar uma vida tranquila
Sem surpresas, por favor

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

In the Gallery

Abandonado e sedento neste longo dia quente
Perdido e solitário de todas as maneiras
Comecei a planar (planar) em torno de mim, céu acima
Sim, eu necessito de um pouco de amor
Eu tenho estado sozinho por muito tempo e meu coração sente dor
Suplicando por alguma confortante chuva
Há um pássaro na árvore, lá em cima, muito acima (no último galho)
Apenas me esperando para morrer
Se eu não obter alguma água logo
Eu estarei morto e enterrado (Eu partirei) no fim da tarde

Uma vez havia um rio, agora há uma pedra
Você sabe que é terrível, quando você está vivendo sozinho

Dire Straits

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Sereníssima

Eu fui apagar o sol
Me disseram que no escuro é melhor viver
Eu fui viajar sozinha
Me disseram que nem todas as fotografias do mundo podem descrever

Eu quis conhecer o amor
Me disseram que era um plagio descarado da dor
Eu quis dançar na chuva
Me disseram que era como voar sonhando

Eu quis tocar o céu
Me disseram que as nuvens eram algodão doce
Eu quis me apaixonar
Me disseram que o primeiro beijo é como balinhas que estalam no céu da boca

Eu pensei em fazer uma música
Me disseram que cantar espantava todos os males
Eu pensei em fazer ballet
Me disseram que era como um avião levantando vôo devagar

Eu vou plantar flores no jardim
Me disseram que faz bem à alma
Eu vou fotografar o pôr-do-sol
Me disseram que fotos são a eternidade colorida em papéis

Eu vou acordar sorrindo
Me disseram que traz sorte
Eu vou aprender francês
Me disseram que Paris é linda em todas as épocas do ano

Eu quero morar em New York
Me disseram que as livrarias mais fantásticas do mundo estão lá
Eu quero passear em Veneza
Me disseram que se pode ouvir os passos das pessoas nas ruas

Me espere na Sala de Espera

Foi a sensação mais fria e morna que eu já tive. A pior dor que se pode suportar (ou quase não suportar). Um grito desesperado ecoava em minha cabeça, todos que estavam naquela sala me pareciam tão mortos quanto o homem que estava ali, sobre a mesa. Minha respiração era tão forte que todos ao redor pareciam ouví-la também e meu coração, era como se estivesse sendo esmagado, sufocado e minha alma, de tão pesada parecia contraí-lo mais ainda tornando suas batidas lentas, intermináveis. Aquele era o pior dia da minha vida e aquela a primeira pessoa que morria em minhas mãos. Um completo desconhecido, com mãe, esposa e dois filhos na sala de espera. Eu não queria parar, mas o desfibrilador fora arrancado de minhas mãos; por pessoas menos esperançosas que eu, talvez. Ou mais racionais - pelo menos naquele momento. Então eu tentei reanimar seu coração com minhas mãos. Aulas e aulas, teses, livros, eu sabia quase tudo, tinha lido muito. Mas nada jamais fora tão real quanto aquele momento. O coração e a vida daquele inocente protagonista de um trágico acidente estavam em minhas mãos e foi nelas que ele bateu pela última vez. Como num último fôlego antes de mergulhar, ele agora mergulhava, para sempre. Eu só não sabia como traduzir o fim de uma vida para aquelas duas mulheres aflitas na sala mais fria do hospital. Eu podia sentir, por dentro eu estava aos prantos, apavorada, derrotada. A primeira vez em anos de profissão. Talvez fosse mera sorte, mas eu sabia, todos sabiam, um dia chegaria o momento de dizer "Sinto muito" a alguém. Quando voltei à realidade o único som que se ouvia era do monitor que momentos antes marcava as batidas do coração do estranho, mas agora ensurdecia a mim com um longo e lancinante "piiiiiiiiiiiii" que de repente sessou, uma enfermeira - a única ainda na sala além dele e de mim - desligou o aparelho que telepaticamente me dizia "Você não conseguiu dessa vez". Possivelmente o outro médico que me acompanhou durante a cirurgia ou até mesmo algum dos residentes tenham me dito algo positivo ou animador, mas eu não prestei atenção. Só tentava me recompor para informá-las, a elas, tão cheias de fé. Eu não estava preparada para encará-las mas, foi somente alguns anos depois que me dei conta de que nunca se está preparada. E eu fui. Abondonei minhas luvas usadas na sala e fui. Aquele corredor nunca foi tão longo e frio como naquele fim de noite. Enfim, a sala de espera e lá estavam elas, lado a lado com olhares distantes; apreensivos de mãe e aflitos de esposa. Os dois pequenos meninos brincavam por perto sem nem imaginar o que estava por vir. Logo nos encontramos, ou melhor, as duas anciosas vieram ao meu encontro:
- E então doutora? perguntou a ainda jovem esposa com a voz embargada, talvez até esperando um notícia não tão boa; uma paralisia, sequelas ou algo assim.

- Eu perdi meu marido há 2 anos, meu filho é tudo que eu tenho, mas eu sou forte, não nos esconda nada. Disse a senhora com os olhos tristes e doces; cansados, mas ainda assim dóceis.

Criei coragem:
- As lesões eram muitas, e muito sérias. O cérebro ficou sem oxigênio por tempo demais, as veias que levam o sangue do coração para o resto do corpo foram muito danificadas, além do pulmão que sofreu perfurações. Ele teve duas paradas cardíacas - o choro da esposa se intensificou me causando grande desconforto e sensibilidade - Nós fizemos todo o possível, persistimos mas [eu parei por alguns instantes até que todas aquelas informações fossem digeridas e por fim...] Eu sinto muito, nós o perdemos. Eu realmente sinto muito [após dizer isso me senti inútil, é o que todos eles sempre dizem, no entanto não havia mais nada que eu pudesse dizer, era toda a minha sinceridade ali naquela sala].

E essa, foi a pior cena da minha vida
Aquela mulher que momentos antes demonstrava, apesar da fragilidade, uma grande força, estava agora desolada e seus olhos azuis escureceram e pareciam vazios, tão fúnebres quanto os de seu marido ao chegar ao hospital. Ela desabou ao chão; gritava, com a voz rouca, seu choro desesperado me fez perder a respiração. E a senhora permanecia imóvel à minha frente, revivendo o mesmo sentimento de dois anos antes. Muda, desolada, petrificada. E eu já nada podia fazer, nem sequer consolá-las (nem ao menos sabia como fazê-lo), além do que eu tinha outra cirurgia marcada para logo mais. [câncer]. Eu naquele momento desejei que os raios de sol que entravam aos poucos pela janela me cegassem, que a voz dos meninos brincando me ensurdecessem, eu só queria me tornar invisível como a chuva que caía fina lá fora. Eu sofri, chorei, pra dentro, comigo, sozinha. Havia me tornado uma máquina.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Meu Coração Vai Se Entregar

Às vezes eles rimam, às vezes não O vapor do chuveiro terá cheiro de eucalipto E você sentirá um abraço forçado, incontrolável Estou ficando intrigada pelo menino das canções andrógenas

Respirações fundas não farão meu cérebro se levantar imóvel Ser amado e engolido são seus únicos pedidos Eu amo falar francês com os motoristas de táxi Nós dormimos e estávamos com frio no trem da França Pela manhã passeamos sob o céu cinza Londres tem sido assim, sempre cinzenta e encantadora Eu amo falar inglês com as crianças no parque The London Eye tomará conta de nós quando o cinza dos céus der lugar à neblina londrina e ao azul negro de inverno

No próximo verão essa cidade não será mais a mesma Você estará em outro trem, eu sei, você não vai dizer nada Despedidas se tornaram minha especialidade e ainda dói

domingo, 18 de janeiro de 2009

Marshmallow Pies


We all live in a Yellow Submarine
Yellow Submarine, Yellow Submarine

Ah, duvido de alguém que ao ouvir pelo menos esse refrão "mágico" hum, (psicodélico) não dê um sorrisão (ou sorrisinho)
Talvez pelo ritmo dançante, pela empolgação dos próprios Beatles ao cantarem
Ou sequer pela graça de hum, se viver em um Submarino Amarelo....

And the band begins to play:
We all live in a Yellow Submarine, Yellow Submarine

À Procura da Rima Perfeita

Cada um vai colher o que plantou
E olha, raiz sem alma, é triste
Me contam coisas como se fossem corpos
Ou realmente são corpos, todas aquelas coisas?
Deixa pra lá eu devo é ta viajando
(Enquanto eu falo besteira o mundo vai, vai...)
Que cê tem em mente? - Se é que tem algo em mente!
O que vale é o que você tem, e não o que você faz
Celebridade é artista (artista que não faz arte)
Deixa pra lá, eu continuo viajando
Enquanto eu falo besteira nego vai, vai
Então deixa...
Andam dizendo que o bem vence o mal, mas até lá...

Deixa, deixa, deixa
Eu dizer o que penso dessa vida
Preciso demais desabafar

Ouvindo: Marcelo D2 - Desabafo

domingo, 11 de janeiro de 2009

Picture yourself on a train in a station


A saudade é um filme sem cor, que o meu coração quer ver colorido
A saudade é Brigitte Bardot, acenando com a mão num filme muito antigo
A saudade é um trem de metrô
Que te levou pra longe e me deixou aqui,
Acenando; tudo em preto e branco
Feito filme antigo, mudo e
antigo

Correndo, até a corrida acabar

Fico agora pensando: Se não existisse o "SE" o que seria dos indecisos?
E de mim, o que seria? Acho que nada. Mas e Se não existisse o nada? Digo, a palavra nada, não o lugar nada ou o acontecimento nada ou seja lá o que quer que signifique nada para eles. Pobre dos indecisos, não teriam um lugar nesse mundo, assim como os tubarões.

sábado, 10 de janeiro de 2009

A Poesia está morta, mas juro que

De repente, não mais que de repente:
Do riso fez-se o pranto
Da nuvem fez-se a chuva
Amor às vezes passa; feito uva
Do sonho fez-se manhã
Do pesadelo, madrugada
Uma gota molhou o livro que
Manchou a página que
Borrou a escrita que
Confundiu o leitor que
Queria saber o fim da história ou estória, como queiram...

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Blue Moon



I´m nobody! Who are you?
Are you nobody too?

Cristalizou-se! Quem? Ela...

Elle est retrouvée.
Quoi?
L'Eternité.
C'est la mer allée
Avec le soleil.


Ela foi encontrada.
Quem?
A Eternidade.
É o mar que se vai
Com o sol que cai.

"Ela gostava do Bandeira e do Bauhaus
De Van Gogh e dos Mutantes
Do Caetano e de
Rimbaud"

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

In the sky with diamonds

Um homem caminha pela Avenida: pés descalços, pijamas listrados, madrugada, a Lua, uma missão.
Um policial cansado avistando a cena, o rotula como um maluco atrás de confusão.
Sim, ele está atrás de algo, mas mal sabe aquele policial mal-pago que é algo além de confusão.
- Hei, pare onde está!
- Sr. Policial, veio acompanhar ao nascer do sol junto a mim?
- Vou ter que te levar pra delegacia! "Deve estar bêbado", pensou o policial se aproximando.
- Adoraria aceitar o seu convite, mas temo que de lá eu não possa ver o sol nascer.
- Tá de gozação é meu amigo? Qual é? Tá drogado?
- Sim, drogado de amor e felicidade Senhor! ...Tirando algo do bolso, "PIJAMAS COM BOLSO!" - que asno, pensou o policial. Tirando algo do bolso....
- Mãos ao alto, pare agora.
- Não posso Sr. Policial, ando de mãos dadas com ela, não posso deixá-la partir, não é a hora ainda.
- Ela quem? Você é maluco? O que é isso em sua mão? Me dê agora.
- Não posso, me foi confiada essa missão, tenho que cumpri-la, é a grande ordem das coisas.
O Policial já cansado da conversa sem sentido, resolveu ver por si próprio o que havia na mão do indivíduo quando este ordenou que ele parasse e no meio da confusão ela saltou de suas mãos, um brilho intenso foi tudo o que se viu. E depois ela surgiu, linda no céu.
Ela quem? A Aurora.

Amoras Silvestres

Ela caminha como se andasse na Lua
E sori como se morasse em Paris
E acredita como se ainda estivesse em 70
E ama como se fosse sempre primavera em New York
É alegre como se o carnaval de Salvador contagiasse o mundo por meses
E vive como se amanhã fosse dia de seguir viagem levando na bagagem todos os amigos do mundo

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Boneca de Piche

Quando você pinta tinta nessa tela cinza

Você me faz parecer menos só, menos sozinho

Menos pó, menos pozinho

Quando você grita: Bala!

No meu velho-oeste

É como pedra e estiligue

Você me fez parecer meio só, sozinho

Quando você diz o que ninguém diz

Não sou, sem rimas foi você quem me marcou.

Flor de Azeviche

de Elevador

Se Guarda-Roupa guarda as roupas
Porque Guarda-Chuva deixa a chuva ir?

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Mas juro que não fui eu

Hoje acordei pensando em fazer algo poético
Pensei em Vinicius, Escutei Tom, Li Caio
Mas ai me lembrei, a poesia já foi feita
Toda ela, está no ar
Não consigo reiventar
A bossa nova ficou velha
E as novas bostas não são dignas
Hoje percebi que só pensar em poesia já é fazê-la
Mas fazê-la não significa escrevê-la
Está em mim, em minha alma
Vinicius sim, era o lirismo em sua forma
E eu?
Apenas sonho com o poeta que quem sabe um dia poderei ser